As leis que nos protegem

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A proteção é essencial em todos os reinos para sobrevivência das espécies, destacado no reino animal o invejável sistema de defesa que protege o porco-espinho. A exemplo do que ocorre nos outros mundos, no mundo humano a civilização aprimorou regras e critérios de proteção destinados a garantir a fruição dos direitos fundamentais, todas elas incorporadas nos ordenamentos jurídicos dos povos. Na própria Declaração Universal dos Direitos Humanos promulgada pela Organização das Nações Unidas, em 10.12.1948 – então e ainda impactada a humanidade pelos horrores da segunda guerra mundial – constam os direitos fundamentais garantidos e indistintamente assegurada à fruição de todos eles, principalmente para proteção da vida, da integridade física e da liberdade. As leis respeitadas e obedecidas constituem eficiente escudo protetor que asseguram os sistemas de convivência. E o desrespeito e fragilização da ordem jurídica desmoraliza o Estado, principalmente quando são agentes estatais os seus autores e isto reclama e exige que se invoque proteção judicial, como alternativa extrema que, por ser extrema, não deve e nem pode falhar.

No nosso sistema constitucional (art. 5º) a proteção de valores fundamentais é muito bem tutelada porque nem a lei pode restringir o acesso ao Poder Judiciário (XXXV), ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (LVII), não haverá Juízo ou Tribunal de Exceção (XXXVII), ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente (LIII) ou privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (LIV), assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (LV), inadmissíveis as provas obtidas por meios ilícitos (LVI), com todos os julgamentos públicos e fundamentadas todas as decisões (art. 93, IX), desfrutando nossos Juízes dos predicamentos garantidores da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídio (art. 95, I, II e III). Diante disso arbitrariedades e manifestações de truculência que ocorram constituirão tão lastimáveis quanto raras e dolorosas exceções, em face das quais o Poder Judiciário nunca pode se omitir.

Nem sempre é ou foi assim. Em alguns momentos de nossa história a ordem jurídica foi atropelada, com os cidadãos fragilizados e privados de seus direitos e facilitadas toda sorte de abusos e truculências sem controle algum. No limiar do Estado Novo, por exemplo o agente comunista estrangeiro Harry Berger, detido e indefeso foi submetido a maus tratos animalescos, permaneceu depositado em cubículo que não lhe permitia ficar de pé, sem banho ou barba feita por mais de um ano o que obrigou seu advogado Sobral Pinto a ingressar com Habeas Corpus perante o Tribunal de Segurança Nacional para garantir-lhe prisão com mínima dignidade, invocando, então, como alternativa única o Decreto de Proteção e Defesa dos Animais (Decreto nº 4.645 de 10.06.1934) que colocava os animais sob tutela do Estado (art. 1º), assistidos em Juízo, dentre outros, também pelo Ministério Público (art. 1º § 3º). Nos termos da lei invocada – que deixou marcas na nossa história política – o pedido foi acolhido. Infelizmente pouco valor se dá a estrutura que deve nos proteger e dela só lembramos quando a truculência nos ameaça ou atinge a nós ou alguém que nos seja próximo, principalmente quando recusada ou omitida a proteção jurisdicional. É pena e é triste que a subversão da ordem jurídica, a supressão das leis que nos protegem de tempos em tempos encontre adeptos esbravejantes que ocupam ruas e espaços de comunicação e atormentam ameaçadoramente nossas rotinas de vida, o que nos obriga a ter justa inveja do sistema de proteção do porco-espinho.

Fonte: JusBrasil